Regional 02.05.2024 21H06
Conguita e Bruno: amigos que o autismo uniu
Centro terapêutico 'Consigo' assinou um protocolo com o Regimento de Cavalaria n.º6, em Braga, para prestar serviços assistidos por equinos.
A Conguita, uma égua de cor clara e olhos grandes e atentos, chegou a Braga a 14 de fevereiro de 2023. A data não foi um acaso, até porque foi amor à primeira vista para Bruno Oliveira, uma criança de cinco anos a quem foi detetado autismo.
Estava dado o primeiro passo para que o centro terapêutico ‘Consigo’ disponibilizasse mais um serviço: terapia assistida por equinos.
Para isso, foi necessário realizar um protocolo com o Regimento de Cavalaria n.º6, que abriu as portas do seu picadeiro às terapeutas e aos cerca de uma dezena de utentes, entre os três e os 17 anos. Crianças e jovens com paralisia cerebral, autismo ou outras necessidades específicas.
Duas vezes por semana, durante meia hora, Carla Ferreira, terapeuta com mais de 20 anos de experiência profissional, acompanha as crianças.
Bruno chegou por volta das 16h00 às instalações do RC6. No picadeiro já o aguardava Conguita, para quem Bruno trazia cenouras. Antes de montar a égua, Bruno sabe exatamente o que tem que fazer: Limpar e escovar a Conguita e equipar-se.
“Cumprimentam a égua, e já aqui há uma aproximação, com o toque no animal, porque temos meninos com diferentes problemáticas e, muitas vezes, a questão até do toque não é muito fácil”, explicou Carla.
Depois, a limpeza do cavalo é feita por fases, primeiro o pelo, depois a cauda e a crina, para que “comecem a identificar as diferentes partes do cavalo e ajudar a aproximá-los”.
Depois disso, está pronto para entrar no Picadeiro. Puxa a escada e, auxiliado, monta a égua indicando o caminho até ao desenho do animal que pretende. Chegado, deve colocar o desenho do animal ou a primeira letra do seu nome. A escolha parece óbvia. O primeiro animal escolhido foi…a égua. “O plano de intervenção é traçado mediante a avaliação que é feita específica de cada criança”, explicou a terapeuta. Mediante as dificuldades de cada utente, pode trabalhar-se mais a “área cognitiva, a área motora, a área comportamental ou a área sensorial”.
“Notam-se diferenças no comportamento da criança. À luz da investigação, sabemos que o movimento tridimensional do cavalo é muito similar à marcha humana, ou seja, isto proporciona uma série de estímulos sensoriais, ao nível do corpo da criança, que a ajudam aqui a ficar mais calma, com mais atenção e controlo postural”, detalhou Carla Ferreira.
As crianças que andam de cadeira de rodas, por exemplo, “veem o mundo de baixo para cima, mas, quando vão para cima do cavalo, elas têm autonomia e veem o mundo de cima para baixo”. “Isto tem um impacto muito grande a nível da confiança e da autoestima”, alertou, considerando que esta “acaba por ser uma das terapias mais ricas, porque trabalha a parte comportamental, cognitiva e sensorial”.
Os cavalos “são muito intuitivos” e se sentem “um menino com dificuldades parece que percebem que têm que se portar bem e se ajustar”. “Para isso, a égua tem que ser muito trabalhada, quer connosco, quer na exposição ao material”, afirmou a terapeuta.
Carla Ferreira diz que este é um tipo de terapia que “cada vez mais se ouve falar” e embora os pais aparentem “alguma expectativa e receio” no início ficam rapidamente “sensibilizados, porque competências que no dia a dia não se veem aqui são atingidas, como é o caso de verem o filho a montar”.
“Ver que ele está a melhorar e feliz é o que queremos, para que seja o mais autónomo possível”.
É o caso de Ana Oliveira, mãe de Bruno, que não nega o entusiasmo do filho nos dias da equoterapia. “Ele adora. Está aqui há um mês e já atingiu os objetivos todos. A concentração dele é muito maior, vem sozinho, trata de tudo e isso é uma conquista”, disse. Ana e o marido pretendem continuar estas sessões, que custam 90 euros por mês.
“Ver que ele está a melhorar e feliz é o que queremos, para que seja o mais autónomo possível”.
Aberto há dois anos, o centro terapêutico assinou o protocolo com o RC6 há cerca de três meses. “Sinto que efetivamente fez sentido, tanto para o quartel como para nós. Desde logo, porque traz o público e a sociedade ao interior do quartel e os utentes acabam por vivenciar e explorar esta zona”, explicou Helena Ferrete, terapeuta e sócia do centro terapêutico. Considerando “um voto de confiança”, este protocolo permite “desenvolver estas atividades”. “Eles estão de portas abertas e este é um grande passo para nós e para a cidade”, finalizou.
A Conguita é a prova de algumas das melhores terapias, afinal, têm quatro cascos e galopam.