Professor da UMinho quer provar que última obra de Clarice Lispector foi ´adulterada`

Carlos Mendes de Sousa, professor da Escola de Letras, Artes e Ciências Humanas da Universidade do Minho, está empenhado em provar que a última obra de Clarice Lispector, assim como o texto que terá escrito no momento da sua morte, terá sido ´adulterado` pela amiga e responsável pela publicação da obra Olga Borelli.
Há vários anos que o investigador do Centro de Estudos Humanísticos da UMinho estuda a obra desta autora, filha de refugiados ucranianos, da segunda metade do século XX. Com um estilo muito próprio entre a poesia e a prova, Clarice Lispector distingue-se na literatura brasileira pela sua escrita feminina e europeia, fugindo das tendências, nomeadamente, do romance social.
Depois dos projetos publicados “Figuras da escritura” e “Cartas de Clarice Lispector”, Carlos Mendes de Sousa tem agora em mãos “um dos trabalhos mais desafiantes” da sua carreira.
Tudo começa com “Clarice Lispector. Esboço para um possível retrato”, de Olga Borelli. “A dado momento, são citadas palavras de Clarice na hora da sua morte. Não se trata de um pequeno texto como Fernando Pessoa. É algo complexo e desenvolvido”, revela o especialista.
Através de uma análise mais profunda, Carlos Mendes de Sousa concluiu que esse texto não foi escrito nesse momento. “Olga Borelli faz uma montagem de textos de proveniência diversa que depois foram interpretados à letra por biógrafos, como Benjamim Moser, entre outros, que reproduziram este texto como tendo sido escrito na hora da sua morte”, explica.
Esta descoberta levou o investigador a direcionar a sua atenção para um verdadeiro “quebra cabeças” que passa pela fragmentação e confronto com os textos originais cedidos pelo filho da autora. O investigador destaca ainda o facto de Olga Borelli ter “tentado dar coerência em alguns pontos ao texto, o que acabou por desvirtuar o mesmo”.
O investigador já desenvolveu projetos sobre Sophia de Mello Breyner Andresen, Eduardo Lourenço e Miguel Torga.
61% dos portugueses não leram um único livro em papel em 2020.
De acordo com um inquérito do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, realizado nos últimos meses de 2020, 61% dos portugueses não leram um único livro em papel e dos 39% que afirmaram ter lido, a maioria leu pouco. Carlos Mendes de Sousa fala num contrassenso, visto que, por outro lado, nunca foram publicados tantos livros.
O docente acredita que as escolas e universidades podem contribuir para esta tentativa de mudança de paradigma, apesar da existência de vários estímulos, através das redes sociais, que retiram “o tempo lento ideal para a leitura de um livro”. Carlos Mendes de Sousa elenca ainda uma questão social, visto que nos dias de hoje muitas pessoas têm trabalhos duros e exigentes, logo será normal que não tenham tanta disponibilidade e vontade para abrir um livro.
