Joana Meneses Fernandes e a Braga 25: “A cidade mudou muito nos últimos dois anos”

No último Campus Verbal de 2025, Joana Meneses Fernandes, administradora executiva da Faz Cultura ainda em exercício de funções à data da conversa com a universitária, faz um balanço profundo do ano em que Braga foi a Capital Portuguesa da Cultura.
Num olhar que recua a 2018, a responsável analisa os sucessos, as críticas e o legado de um projeto que, segundo afirma, posicionou Braga como uma referência nacional na criação artística contemporânea. Com o testemunho agora passado a Ponta Delgada, a entrevista conduzida pela jornalista Elsa Moura explora os números de um ano intenso, os desafios da descentralização cultural e o futuro dos equipamentos da cidade.
O Sucesso Coletivo e o Percurso de Longo Prazo
Joana Meneses Fernandes sublinha que os resultados de 2025 não devem ser vistos de forma isolada ou como um evento espontâneo, mas sim como o culminar de uma estratégia estruturada desde a candidatura à Capital Europeia da Cultura 2027. Segundo a administradora, “tudo aquilo que imaginaram e sonharam em conjunto com os bracarenses se concretizou este ano”, reforçando que o impacto sentido agora advém de um processo de maturação. “É, na verdade, um caminho, um percurso com muitos anos, e tudo o que é o resultado da mobilização dos agentes, públicos e comunidades resulta precisamente desse processo.”
Números de Impacto e a Cultura da Acessibilidade
Os dados tratados até outubro revelam a magnitude da operação cultural em Braga, com um alcance que superou as expectativas iniciais. Com mais de 1150 atividades, a Capital Portuguesa da Cultura focou-se na participação ativa. “Conseguimos alcançar cerca de um milhão e meio de pessoas, entre público e participantes ativos. São comunidades muito presentes nos processos de trabalho”, explica Joana.
Além disso, destacou o pioneirismo na inclusão: “A dimensão da acessibilidade não passou apenas pela audiodescrição ou língua gestual, mas pelo facto de algumas destas atividades incluírem nas suas próprias equipas pessoas com necessidades específicas. Este é um caminho onde é preciso persistir”, sublinha.
Descentralização: Responder às Críticas com Proximidade
Face às críticas de que a agenda teria sido preenchida por eventos já habituais no calendário, a administradora defende a natureza inovadora dos projetos da Faz Cultura, muitos deles realizados em contextos não convencionais. “Percebo que o formato destes projetos é pouco comum para aquilo que a cidade estava habituada. Aconteceram de forma muito descentralizada, em bairros residenciais, um pouco mais longe daquilo que é o olhar habitual dos bracarenses”, afirma.
Joana assume ainda a dificuldade de envolver todos os agentes: “Quando o nosso objetivo é trazer o maior número de vozes possível para uma construção coletiva, há sempre o sentimento de que alguém possa ter sentido que não teve o devido espaço, apesar de todo o nosso esforço.”
Braga como Referência no Panorama Nacional
A afirmação de Braga como um polo de criação contemporânea foi, segundo Joana Meneses Fernandes, validada pelo reconhecimento de parceiros externos de renome. “Temos tido o feedback de muitos parceiros que sentem que Braga hoje, do ponto de vista da sua programação e criação artística contemporânea, é uma referência já não apenas na região, mas no território nacional”, destaca. Como exemplo, cita o espetáculo Um Inimigo do Povo, de Marco Martins: “O Centro Cultural de Belém, que foi assistir à estreia, manifestou essa opinião de reconhecimento. Isto tem acontecido recorrentemente com instituições que têm um alcance nacional.”
Infraestruturas: O Futuro do São Geraldo e Novos Espaços
A reabilitação do antigo cinema São Geraldo para acolher o Braga Media Arts Center continua a ser uma prioridade, apesar dos desafios no calendário. Joana justifica a espera pela complexidade técnica da obra: “Estamos a falar de um projeto ambicioso. São equipamentos que necessitam de um tempo de pensamento e planeamento para evitar constrangimentos futuros.” Sobre a visão do novo executivo municipal em criar novos espaços multidisciplinares, a administradora concorda plenamente: “Faltam espaços de trabalho para as estruturas e artistas com respostas multidisciplinares.”
Um Legado de Equipa e o Fim de Ciclo
Com o encerramento de 2025, Joana Meneses Fernandes encara este momento como o fim natural de uma missão que começou em 2018. Reflete com satisfação sobre a evolução da cidade e da própria empresa municipal. “A cidade de facto mudou muito nos últimos dois anos, mas é importante dizer que isto não foi feito apenas por mim. Foi num exercício de equipa e de muita cumplicidade”, refere, mencionando a colaboração com Luís Fernandes e as equipas da Braga 25.
Para o futuro, deixa uma estrutura mais robusta: “Hoje, a Faz Cultura tem uma equipa muito mais capacitada para novos desafios. O legado de tudo isto vai muito para além do meu papel e das minhas funções.”
O que fica depois das luzes da Capital Portuguesa da Cultura se apagarem? Joana Meneses Fernandes enfatiza que o fim do calendário oficial não deve significar um desinvestimento na estratégia cultural da cidade. “A capital não deve terminar no dia 28 de dezembro, com a passagem de testemunho a Ponta Delgada. Este caminho deve continuar e necessita, obviamente, de um suporte financeiro e de um investimento constante na área da cultura”, alerta.
Para a administradora, Braga alcançou um patamar de reconhecimento que exige coerência nas políticas futuras e “no qual não se deve agora desinvestir”. “É fundamental continuar a trabalhar nesta dimensão territorial alargada e prosseguir o esforço de captação de financiamentos europeus, um caminho que a Braga Media Arts já tem vindo a consolidar de forma muito positiva.”
“Este caminho deve continuar. Alcançámos um estatuto de reconhecimento nacional no qual não se deve agora desinvestir.”
Joana Meneses Fernandes
c/Elsa Moura
