Crianças de Braga percorreram mais de 400 quilómetros nas viagens casa-escola

Sexta-feira, Lamaçães.

Passavam 35 minutos das oito da manhã. Na Rua Amândio César estavam já dois dos três maquinistas que, semanalmente, acompanham as crianças da Escola Básica de Lamaçães que integram o projeto do município de Braga, ‘Ciclo Expresso’. Daí a nada, chegava, Tânia Cova, mãe de dois dos jovens ciclistas e uma das nove monitoras.

Munidos do seu novo meio de transporte dão início ao percurso de cerca de dois quilómetros. Seguem-se cerca de 20 minutos até ao destino, a escola, e pelo meio há quatro paragens, para que mais seis colegas integrem o comboio. A dinâmica repete-se na EB 2/3 da mesma localidade e ainda na Escola Básica 2/3 André Soares. O projeto, que arrancou nos primeiros meses de 2023, contou com 50 inscrições, mas acabaram por participar apenas 24 crianças.

O objetivo deste ‘Ciclo Expresso’ é promover uma “transformação modal nos hábitos dos munícipes”, adianta Olga Pereira. Com a tutela da Mobilidade, a vereadora da Câmara de Braga lembra a importância, nos dias de hoje, de “retirar carros das cidades, melhorar o ambiente e contribuir para uma diminuição das emissões carbónicas”. Nesse sentido, acrescenta, o Município de Braga tem promovido diferentes ações e investido “muito dinheiro em infraestruturas”, desde logo, ciclovias. O ‘School Bus’ é um dos projetos que partilha destas intenções, mas o ‘Ciclo Expresso’ tem ainda outro objetivo associado: “incentiva a autonomia das crianças”.

“Braga ainda não é uma cidade segura” para os ciclistas

Tânia Covas utiliza a bicicleta para muitas das suas deslocações. Andar no comboio do ‘Ciclo Expresso’, diz, dá-lhe mais segurança, porque a dimensão do grupo torna os ciclistas mais visíveis aos automobilistas e todos se sentem “mais seguros”. E por falar em segurança, Tânia garante que “Braga ainda não é uma cidade segura” para os ciclistas. Além das infraestruturas, refere, “o grave problema são as interseções”. “Quando nós temos que parar para atravessar nas passadeiras ou quando temos que atravessar as estradas, os carros muitas vezes circulam rápido e não veem”, detalhou.

Tânia anda de bicicleta porque “é muito mais rápido e prático”, mas, por exemplo, o marido leva os filhos à escola de carro. O filho, Guilherme Andrade, confessa que prefere ir de bicicleta, por estar “ao ar livre e ver outros sítios”. Diz que não é cansativo e nem a chuva o impede de fazer o percurso sobre duas rodas: “Com a chuva venho de impermeável, se chover torrencialmente visto as calças impermeáveis também”.

Guilherme e a irmã fazem o percurso desde o início. Mariana Malotti entra na segunda paragem e o entusiamo não deixa dúvidas, também para ela “é mais divertido” ir com os colegas para a escola do que de carro com os pais. O ritual é o mesmo todas as sextas-feiras: Coloca o capacete na cabeça e o cadeado na mochila, desce até à garagem para pegar na bicicleta. 

É melhor ir de bicicleta, porque praticamos exercício físico e convivemos com os nossos colegas até à escola. Parece que o tempo fica mais divertido”, explica. A pequena Mariana diz não ter medo de andar de bicicleta na estrada, mas confessa que já sentiu alguns carros aproximarem-se dela. Ainda assim, o percurso foi sempre cumprido sem problemas. As lombas que existem na estrada, admite, são a parte preferida do caminho. “É muito fixe passar por cima”, reforça. Entre circular nas ciclovias ou na estrada, Mariana prefere a estrada, porque “é mais divertido e há mais aventuras”. Segundo Tânia Covas, nas ciclovias as crianças circulam de forma menos atenta, por se sentirem mais seguros.

“Mesmo não vindo no comboio, já há pais que vêm de bicicleta trazer os filhos”

Clara Matos é a coordenadora da Escola Básica de Lamaçães e abraçou o projeto por o considerar “interessante”. “Acho que se deve incentivar os alunos a andar de bicicleta”, diz. Depois de os primeiros alunos aderirem foram incentivando outros e “já houve pais a questionar como se adere ao projeto”. “Mesmo não vindo no comboio, já há pais que vêm de bicicleta trazer os filhos”, revela a docente.

Ainda assim, nem tudo corre de feição. Quando o comboio de bicicletas chega à Escola, muitas vezes encontra a “entrada barrada”, por viaturas indevidamente estacionadas.

Voltamos aos maquinistas. Esta viagem foi liderada por João Araújo, um jovem estudante universitário que quis juntar-se ao ‘Ciclo Expresso’ por considerar “a iniciativa interessante”. “Eles começam a ganhar responsabilidade, têm que cumprir regras e ganham independência”, afirma. Para João, esta forma de se deslocarem acaba também por ser um momento de diversão que os motiva a ir à escola.

“Uma das bases é saber andar minimamente de bicicleta, mas já tivemos uma menina que tinha alguma dificuldade e vinha de rodinhas”, explica Tânia. O processo de organização do comboio começa no dia anterior, explica a monitora, através de um grupo do WhatsApp, onde se confirmam as crianças que seguem de bicicleta no dia seguinte, para o grupo se organizar e saber as paragens que são necessárias fazer.


Continuidade do projeto ainda vai ser analisada


O ‘Ciclo Expresso’ tem a sua última viagem deste ano letivo esta sexta-feira, 30 de junho, e a continuidade do projeto ainda vai ser avaliada pelo município.

“Houve uma recetividade interessante, não aquela que se calhar estávamos à espera, mas os números são bastante interessantes. Fizeram-se 50 circulações de comboio, 210 viagens individuais de crianças para a escola, das quais 100 correspondem a uma efetiva transição modal do automóvel privado em função dos hábitos que as pessoas traziam”, adiantou Olga Pereira. Segundo a vereadora da Mobilidade, “foram pedalados 406 quilómetros e foram formados nove monitores locais”.

Ainda que não se saiba se o ‘Ciclo Expresso’ regressa em setembro, mas Mariana Malotti deixa, desde já, um pedido à Câmara Municipal: “Podemos ter mais um dia para andar de bicicleta? Por exemplo, quarta-feira e sexta-feira?”.

Em Braga, dá-se ao pedal para chegar à escola. As pernas são o motor destas crianças que trilham caminhos para serem amigos do ambiente e da saúde. 

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Liliana Oliveira
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