Covid-19 deixa divertimentos e restauração itinerantes sem rendimento

O verão vai, este ano, ser diferente de todos os outros. Muitas questões estão ainda a ser analisadas, mas é certa a companhia indesejada da Covid-19.

Fruto disso, este ano não há S. João em Braga, Santo António em Vila Nova de Famalicão, nem Festa das Cruzes em Barcelos. O verão não contará com o cheiro a farturas, nem com o barulho das diversões. A maioria das festas e romarias foram canceladas. Mais uma consequência do novo coronavírus, só que esta arrasta o sector das diversões e restauração itinerantes para uma crise nunca vista.

“Somos esquecidos, ninguém se lembra de nós”

Joana Gomes vende farturas há 11 anos. Durante o verão, entre Março e Outubro, percorre cerca de 30 festas na região, acompanhada pelo marido. Este ano, sem romarias e privados de trabalhar os prejuízos já se fazem sentir. “Não há rendimento e eu tenho dois filhos. Estamos os quatro com a ajuda de familiares e amigos. O que temos é para comer”, lamentou. As ajudas, diz, “são poucas” e ainda tem que suportar o pagamento de seguros e de outras despesas.


O tempo força a criatividade. O casal tem tentado trabalhar através de take-away, mas assegura que lhe está a ser “cortada essa possibilidade”, porque têm que aguardar pelas decisões “do ministério”.

Não há previsão para o retorno da actividade deste sector. Na pior das hipóteses estarão parados um ano e meio, retomando apenas em Março de 2021. Com o sentimento de ver a sua vida em stand-by, Joana teme não ter condições para retomar no próximo ano. “Somos esquecidos, ninguém se lembra de nós”, frisa.


Joana lamenta que o sector não possa recomeçar de acordo com as normas de segurança impostas pela Direcção-Geral da Saúde para outros sectores. “Estamos mais seguros do que os restaurantes, não estamos num espaço fechado, não temos contacto com os clientes, estamos atrás de um balcão protegidos e equipados”, exemplificou. Por esta altura, e perante a incerteza do futuro, o casal já pensa em vender, por exemplo, os carros. “Com dois filhos, não quero chegar ao ponto de dizer que não tenho nada para comer”, apontou Joana.

Sem S. João, Zé das Caldas está em casa “à espera” do futuro

Passamos agora a uma das roulotes mais procuradas do S. João de Braga. As bifanas são a especialidade do negócio de José Henriques, há mais de 40 anos. Todos os anos, um mês antes da romaria bracarense já se avista, junto ao Parque da Ponte, o espaço do “Zé das Caldas”. O S. João é a maior das cinco festas em que costuma participar.

Este ano, está “em casa, à espera”. Contava vir para Braga a 25 de Maio. Não factura desde o final de Setembro. “Vamos esperando, é um prejuízo geral, mas, pelo menos, não estamos a desgastar material, está tudo nos armazéns”, afirmou. A paragem forçada afecta mais familiares, mas vai contando com o que a terra lhe dá.

José partilha da ideia de Joana. Acha que “se fosse uma coisa bem pensada” a actividade podia recomeçar.

Com alguns seguros já pagos, para que pudesse arrancar em Março, o prejuízo é notório, mas conta aguentar até 2021.


“Há famílias a passar fome”

As associações ligadas ao sector, Associação dos Profissionais Itinerantes Certificados (APIC) e Associação Portuguesa de Empresas de Diversão (APED), apelam à criação de parques de diversão, em colaboração com as autarquias, com lotação controlada e limitada.

Francisco Bernardo, presidente da APED, fala em “pequenos parques provisórios, em zonas estratégicas das cidades”, assegurando que os profissionais “conseguem implementar as medidas impostas pela DGS”.

“Os apoios são curtos e muitas vezes inacessíveis. Não nos isentam de qualquer tipo de imposto ou da Taxa Social Única, mas, por exemplo, os veículos só podem transportar este tipo de material, porque razão cobram o imposto se o veículo não vai circular?”, questiona.

O sector conta com mais de 800 microempresas, que englobam, sobretudo, agregados familiares. “As famílias estão desesperadas. Não se vê a luz ao fundo do túnel”, adiantou Francisco Bernardo.

Já Luís Paulo Fernandes garante que, neste momento, “90% das festas estão canceladas”. “O Governo não tem preparado qualquer tipo de plano, nem se lembrou de nós”, afirmou o líder da APIC, depois de uma reunião com o Governo na semana passada não ter dado frutos.

“Temos que fazer o que está a ser feito na Dinamarca ou na Alemanha, que é um vale de sustento familiar ou empresarial”, que ajuda, por exemplo, no pagamento de impostos. O presidente da APIC sugere a suspensão do pagamento dos impostos ou contribuições para a Segurança Social, para que o sector aguente.

“Há relatos de desespero, há famílias a passar fome e a pedir ajuda ao Banco Alimentar”, denunciou Luís Paulo Fernandes.

Francisco Bernardo lembra ainda uma luta antiga destes profissionais, que é a descida do IVA de 23 para 6% para aumentar a margem de lucro e ajudar na retoma.

“Vai haver um gastar de recursos que quando for para iniciar a actividade não vamos conseguir suportar os encargos”, alertou o presidente da APED.

Não há carrocéis, farturas ou bifanas. Estes profissionais, que todos os anos levam parte da alegria às romarias de Portugal, sentem-se esquecidos, reclamam a falta de apoios e pedem alguma esperança para que este não seja o fim da festa. 

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Liliana Oliveira
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