‘Cordyceps’. A peça que esmiuça o papel das memórias no último dia de liberdade

Parte do último dia da democracia e enovela-se em torno de memórias vividas até então, das mais simples até às mais complexas. A peça de teatro ‘Cordyceps’, inserida nos Festivais Gil Vicente, estreia na próxima quinta-feira, 3 de junho, às 19h30, no pequeno auditório do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães.
Em palco estão os criadores e atores Eduardo Molina, João Pedro Leal e Marco Mendonça, que se debruçam sobre a construção e a perceção da realidade de cada um. De acordo com Marco Mendonça, o espetáculo gira em torno do fungo ‘Cordyceps’, que vai “originar o fim da democracia”. O foco é o presente e, sobretudo, o passado e “a autonomia ou não das pessoas em relação àquilo que se lembram”.
“Tentamos perceber como as nossas memórias são influenciadas pela memória de pessoas próximas e da cultura que consumimos. Começamos por retratar coisas pequenas, como a confusão com a forma como se escreve ‘Looney Tunes’, e vai subindo de importância até à questão do fim da democracia e do porquê de estar a acontecer”, desenvolve.
Cordyceps é, como explica Eduardo Molina, “um fungo que se aloja em insetos ou artrópodes, infetando-os e fazendo com que se comportem apenas da forma como o parasita quer”. “O fungo faz o inseto afastar-se da sua colónia à procura do sítio perfeito, mas, quando pensa que o encontra, crava as suas maníbulas nesse lugar até morrer”, acrescenta.
A ligação indireta à ditadura e a ‘caça aos gambozinos’
Pensada antes de surgir a pandemia, esta peça aborda o modo como a contaminação de algo pode acontecer de forma tão rápida e abrangente. O foco desta reflexão o ser humano, partindo de um fenómeno que existe na natureza.
João Pedro Leal admite que a história pode estar relacionada com um sistema ditatorial, “em que algumas memórias são reprimidas”, mas garante que o objetivo não passa por aí, até porque, refere, “o fim da democracia não significa forçosamente que se aproxima um regime desses”.
Era suposto estar em palco um coro juvenil denominado ‘Bando dos Gambozinos’, algo que não vai acontecer por causa da pandemia. Em contrapartida, os jovens serão representados em cena por fotografias suas em cartão.
Como revela Marco Mendonça, a referência a esse animal imaginário não é por acaso, destacando que “os gambozinos existem, mas que apenas se tornam em verdade na imaginação”.
