Augusto Santos Silva identifica “duas doenças” no Ensino Superior em Portugal

O presidente da Assembleia República alerta para “uma doença quantofrénica” que está “a corroer” o Ensino Superior. Na cerimónia comemorativa dos 49 anos da Universidade do Minho, Augusto Santos Silva deixou algumas críticas ao modo como a comunidade académica enfrenta os tempos atuais.
Citando o sociólogo Pitirim Sorokin, a segunda maior figura do Estado argumenta que “a ideia de ser mais produtivo o cientista, o investigador, o académico que mais artigos publicar, que mais citações tiver e que mais vezes for citado, é preversa”, considerando que “os efeitos estão hoje bem visíveis nas universidades e devem ser combatidos”. “Não há universidade sem conhecimento, mas o conhecimento não se perceciona com métricas que tenham como pressuposto que não se avalia a qualidade do que se produz”, sinaliza.
Advogando que “as métricas são necessárias para avaliar o que se faz”, até porque o contrário “colocaria em causa a profissão”, Augusto Santos Silva, docente catedrático da Universidade do Porto, diz que o foco deve estar na “avaliação de conteúdos e de qualidade” e no pensamento crítico.
A segunda doença, no seu entender, relaciona-se com a noção de que “a função de ensinar é candidata óbvia ao sacrifício quando as regras de financiamento ou as parcerias com entidades externas não deixam tempo para percorrer a verdadeira missão”.“Universitários que não põem no coração da sua atividade a relação com os estudantes não merecem o nome de universitários”, refere, classificando-o como “um erro dramático” e fazendo referência ao discurso da presidente da associação académica, Margarida Isaías.
Não só de críticas se fez a intervenção de Augusto Santos Silva. O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros elogia “a ligação muito próxima, no bom sentido, da Universidade do Minho ao tecido empresarial”. Além disso, vinca o modo como a academia minhota, “sem perder o sentido de ter os pés na sua terra”, tem traçado um caminho “internacional”.
Reitor volta a alertar para “a profunda injustiça” do modelo de financiamento
Atualmente, a academia minhota conta com 21 mil alunos e 3.000 professores, investigadores e trabalhadores técnicos, administrativos e de gestão. No final de 2022, a Universidade do Minho tinha em curso 777 projetos de investigação e desenvolvimento, correspondendo-lhes um valor global em execução de 220 milhões de euros.
Desse total, 124 eram financiados pela Agência Nacional de Inovação e pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, num valor aproximado de 38 milhões, e 114 eram de cariz europeu, com um orçamento que ultrapassava os 36 milhões.
Para o reitor, as universidades e a sociedade deparam-se com “um tempo de convulsão, que coloca desafios de grande monta”. Para o enfrentar, considera que as instituições de ensino superior “podem não ser o motor da história, mas importantes fatores de construção de um mundo mais desenvolvido, mais justo, mais sustentável, de uma sociedade mais democrática, inclusiva e harmoniosa, de uma vida mais digna e mais decente”.
Na prossecussão dessa ideia, Rui Vieira de Castro espera que “o governo assuma as suas responsabilidades”. O responsável máximo lembra as consequências que a não aplicação da lei teve na dotação financeira da universidade nos últimos anos, levando a “um incompreensível e inaceitável estado de coisas em que o financiamento por estudante da Universidade do Minho, através do Orçamento de Estado, chega a ser cerca de um terço do valor que corresponde a outras instituições de Ensino Superior”.
“O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, na preparação do orçamento para 2023”, lembra, foi “capaz de reconhecer a profunda injustiça que vinha sendo praticada com a Universidade do Minho, procedendo à identificação explícita do valor que, por aplicação da Portaria 231/2006, lhe deveria ser atribuído, discriminando positivamente, em consequência, a UMinho na atribuição das dotações orçamentais”.
O reitor espera que “o caminho de reparação dessa injustiça histórica seja prosseguido no próximo exercício orçamental”. Ainda assim, deixa duas questões: “Como estaria hoje a universidade se tivesse sido dotada dos recursos que legitimamente lhe cabiam? Como pode ser compensada a Universidade dos sucessivos défices de financiamento de que foi objeto?”.
Este assunto também foi abordado pela presidente do Conselho Geral da Universidade do Minho, que alertou para a necessidade “urgente da consagração legal de um novo modelo de financiamento, justo e equitativo”. Outra das linha do discurso de Joana Marques Vidal passou pela revisão dos Estatutos da Universidade do Minho, que será agora objeto de análise e debate e votação no órgão que lidera.
“Independentemente do resultado final deste processo de revisão, a proposta apresentada, designadamente quanto ao grau de autonomia das unidades orgânicas, constituirá um verdadeiro desafio à capacidade de solidariedade institucional e de coesão da nossa universidade”, sublinha.
