Portugal quer ser dos primeiros a fechar plano de recuperação na UE

Portugal vai receber 15,3 mil milhões de euros em subvenções (a fundo perdido), incluindo 13,2 mil milhões de euros, até 2023, através do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, o principal instrumento do Fundo de Recuperação.
O primeiro-ministro apresentou, esta terça-feira, as linhas gerais do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para o país. Para o chefe do Governo, o plano assenta em quatro grandes pontos: desenvolver a resiliência do país, apostar na transição climática e na transição digital e exigir a cada país que responda às recomendações.
O chefe do Governo afirmou hoje que Portugal quer ser um dos primeiros países a acordar com a Comissão Europeia o seu Plano de Recuperação e Resiliência, dizendo que o país “tem de estar na linha da frente”.
António Costa assumiu este objetivo numa conferência que decorreu na Fundação Champalimaud, em Lisboa, depois de a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ter apresentado o Plano de Recuperação da União Europeia perante uma plateia com muitos ministros e secretários de Estado, autarcas, representantes dos governos regionais, parceiros sociais e responsáveis de instituições académicas portuguesas.
O primeiro-ministro disse que o calendário do seu Governo é o de aprovar o Programa de Recuperação e Resiliência do país em 14 de outubro, entregando no dia seguinte, a 15, o primeiro “draft” à Comissão Europeia.
“Queremos ser dos primeiros países a fechar o acordo com a Comissão Europeia. Queremos fazê-lo porque queremos estar na linha da frente neste trabalho pela resiliência e pela recuperação da Europa”, justificou.
Para António Costa, é essencial que Portugal se coloque “na linha da frente”, porque a recuperação do país também tem de ser a primeira prioridade.
“Ao mesmo tempo que temos de controlar a pandemia, temos de ser capazes de recuperar a nossa economia, proteger os empregos, recuperar os empregos perdidos e recuperar rendimentos que estão a ser perdidos. Temos de recuperar a trajetória de convergência que tínhamos com a União Europeia”, sustentou António Costa.
Programa e recuperação e resiliência tem de se articular com um conjunto de outros instrumentos
O primeiro-ministro reforçou ainda que o programa de recuperação e resiliência tem de se articular com um conjunto de outros instrumentos – como o Portugal 2020 que está em execução até 2023, ou o Horizon, ligado à investigação científica, e ainda tem de se articular com investimentos privados – como 5G ou o novo aeroporto de Lisboa.
Este processo deve estar “ancorado” de forma a assegurar estabilidade das opções e coerência dos instrumentos, fundamental para agir de forma consequente ao longo de toda a década. Tendo em conta o “conjunto dos instrumentos”, Portugal teve de ter em conta alguns factores:
Elegibilidade: “Portugal teve de escolher projectos que contribuam para a resiliência” e que correspondam “às recomendações especificas de 2019 e 2020”
Exequíveis até 2026: O investimento na infra-estrutura ferroviária não é um desses projectos, mas tem investimento alternativo. O mesmo para as linhas de metro de Lisboa ou do Porto, mas que são projectos de mobilidade sustentáveis que fazem sentido no âmbito deste plano;
Mobilização de subvenções e empréstimos: “Temos dívida pública elevada e temos de sair mais fortes do ponto de vista social e económico, mais modernos, verdes e sólidos do ponto de vista económico”. Recorreremos apenas a subvenções e não a a empréstimos, enquanto a saúde financeira do país não permitir.
Projectos que tenham muito efeito e possam contribuir para mobilização imediata da economia, para impedir desemprego, e que tenha efeito estrutural;
Que possam ser executados em parceria, quer com autarquias, quer com terceiro sector ou universidades. “Se executado centralmente pelo Estado é impossível de cumprir até 2026”.
Foi com base nestes parâmetros que se definiram prioridades: enfrentar as vulnerabilidades sociais do país, aumentar potencial de crescimento e reforçar a coesão territorial.
Sobre as vulnerabilidades, Costa salienta alguns aspectos em destaque neste plano de recuperação:
Cuidados dos idosos: com a conclusão da rede de cuidados continuados integrados, desenvolvimento de programas de apoio domiciliário, saúde mental, cuidadores informais, que são “essenciais para robustecer capacidade de resposta a uma população cada vez mais envelhecida”;
Necessidade de habitação: respondendo às famílias que ainda não tem habitação e às necessidades “críticas” como pobreza extrema ou violência doméstica
Geografia das “fracturas sociais”: as Áreas Metropolitanas enquanto locais desenvolvidos e dinâmicos mas também “onde se concentram maiores fracturas sociais” e onde são mais profundas as bolsas de pobreza
“A crise atingiu-nos num dos momentos em que estávamos a recuperar a nossa trajectória de convergência com a EU”, disse Costa. Por isso é fundamental aumentar potencial produtivo:
Reforçando qualificações e investindo na inovação – como ensino profissional, crítico para reforçar qualidade de recursos humanos nos quadros técnicos, com um programa especifico para as STEM e assente na inovação;
Colocando as universidades ao lado das empresas e autarquias locais e desenvolvimendo a agricultura: “A produção de conhecimento devem estar ao lado das autarquias locais e empresas porque é fundamental criar um ‘triângulo virtuoso’ para valorizar o melhor da produção de conhecimento que o país tem e podermos ter empresas que são capazes de produzir em Portugal novos produtos e valor acrescentado.”;
Criando uma economia de valor acrescentado que trave riscos de emigração da geração mais qualificada: “Temos de ser capazes de fixar com empresas mais competitivas, em novas áreas industriais, de ponta, onde temos de nos colocar”, explica o primeiro-ministro. Algo que passa também por “valorizar investimento estrangeiro”.
Programa “centrado no interior do país
Costa apresentou um programa “centrado no interior do país, nas zonas onde mais temos de investir para conseguir vencer atrasos do desenvolvimento económico”:
Apostando na conectividade de áreas empresariais do interior;
Apostando nas ligações transfronteiriças que rompam isolamento do interior em relação a Espanha: “As regiões de fronteira de toda a Europa são as mais desenvolvidas”, salienta. Só Portugal e Espanha são excepção. Estas pequenas ligações “mudam completamente a geografia” e a percepção das cidades do interior.
Mobilidade sustentável, eficiência energética e descarbonização
O plano da resiliência tem de estar articulado com transição climática, que também tem três pilares fundamentais:
Mobilidade sustentável: com aquisição de material circulante da ferrovia, apoiando o desenvolvimento de um novo cluster em Portugal, o ferroviário;
Melhorar eficiência energética “nomeadamente dos edifícios”;
Investimento na descarbonização da indústria e em particular “na reforma do sector dos bioresíduos”.
Outra das grandes apostas deste plano é o digital e passa pela digitalização de:
Escolas: área “crítica”, especialmente na “formação de recursos humanos e desenvolvimento dos conteúdos”. “Não só para ensino à distância mas também porque o digital deve estar no interior da escola.”;
Empresas: tecido empresarial composto por micro, pequenas e medias empresas que saem favorecidas com a digitalização. “Tem de se investir na capacitação de pequenas e médias empresas, mas também maximizar oportunidade destas empresas utilizarem oportunidades das ferramentas digitais”;
Formação de activos: esta mudança tem de ser feita sem deixar ninguém para trás, desenvolvendo aquele que é um dos pilares dos direitos sociais da EU – a solidariedade. “O medo alimenta as derivas populistas”, disse Costa. “É necessário combater o medo, dando confiança às pessoas na sua capacidade para poderem comandar os robôs que ocupam o posto de trabalho que tem actualmente. (…) Não podemos travar desenvolvimento, temos é de garantir que é feito de forma inclusiva.”
Investimento na administração pública é outras das prioridades
De acordo com António Costa, investir na administração pública é “critico para a cidadania e desenvolvimento das empresas”. “É o estado a investir para servir melhor o cidadão e a academia.”
As mudanças passam pela criação de um portal único de acesso ao cidadão – como uma loja do cidadão digital — e rejuvenescimento da administração pública. Há ainda três planos específicos que o primeiro-ministro quis salientar: na área da saúde, “para se utilizar todo o potencial das tecnologias”; na área da Segurança Social, “onde é crítico ter um sistema informático operacional que assegure uma resposta pronta em caso de necessidade” e na área da justiça, “que deve reduzir custos”.
António Costa: “Recuperar não significa voltar a onde estávamos”
“Não podemos chegar ao fim [do processo de recuperação] e estar onde estávamos em Fevereiro. Temos de sair mais fortes”, vinca o primeiro-ministro. Porque “aceleramos a nossa transição climática e digital. Assim conseguiremos ser um país mais prospero e com melhores condições para a nova geração.”
Este é um plano que “não se pode limitar a responder à crise” actual, mas a “preparar crises futuras”. E é um plano que estará em debate até 14 de Outubro, para que, em conjunto se possa construir um “plano para todas as portuguesas e portugueses” e para que o “draft” que será apresentado em Bruxelas a 15 de Outubro seja já o mais completo possível.
c/ Lusa e Público
